O Brasil é o segundo maior consumidor mundial de fragrâncias, somente atrás dos Estados Unidos. Segundo a Euromonitor International, empresa global de pesquisa de mercado, quando o mercado de perfumaria no mundo faturou US$ 44,26 bilhões em 2020, os Estados Unidos atingiram 18,26% desse total, o Brasil 12,26% e a Alemanha, em terceiro lugar no ranking, 5,41%.
De fato, os números apontam que as fragrâncias fazem parte da rotina dos brasileiros, pois representa 22,9% do total dos produtos de HPPC (Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos), enquanto que globalmente esse percentual é de 9,1% e nos Estados Unidos, 8,9%. Além disso, no ano passado, quando as lojas de perfumaria passaram muito tempo fechadas ou com restrições de funcionamento, devido à pandemia, a categoria teve um crescimento de 8,4% (vendas ex-factory) em relação ao ano anterior. De acordo com a ABIHPEC (Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos), as empresas se reinventaram e investiram em canais de vendas alternativos, o que atraiu compradores mesmo à distância. A possibilidade de fazer compras pelo e-commerce, de trocar experiências nas redes sociais e de interagir com as marcas virtualmente, garantiu o acesso dos consumidores aos itens de perfumaria. Outro ponto de destaque foi o aumento do interesse do brasileiro pelos perfumes nacionais não só devido às restrições de viagens ao exterior, mas também em decorrência do aumento de preços para itens importados, consequência do aumento do dólar.
A Euromonitor prevê que até 2025, o segmento de perfumes no Brasil cresça 15,9% em valor, o que representa uma projeção próxima ao crescimento global de 17% para a categoria e bem à frente dos Estados Unidos, onde a expectativa é de 3,4%.
Amostragem e Experimentação nas vendas digitais
Para os próximos anos, conforme o mundo se esforça para restabelecer o cenário pré-pandemia, o público reavalia suas prioridades e critérios de consumo e, consequentemente, o mercado de perfumes terá que estar alinhado a essas demandas. De acordo com a Segmenta, empresa latino-americana de inteligência de mercado, a experimentação das fragrâncias, muito dependente das lojas físicas, tem sido ampliada para o ambiente online por marcas que passaram a oferecer amostras e devoluções de produtos, mini tamanhos e novas tecnologias para um teste mais seguro.
A marca americana Dossier, por exemplo, envia a amostra juntamente com a fragrância comprada. Se o consumidor não gostar, pode devolver o frasco fechado em até 30 dias. De modo muito similar, a marca peruana Falabella oferece a mesma experiência de compra e teste.
A Snif, outra marca americana, envia um kit com uma fragrância ou um kit com três opções para o consumidor testar em até sete dias. Ao final do período, o cartão é debitado pelos frascos de tamanho normal escolhidos ou a devolução pode ser feita gratuitamente.
Já a brasileira Amyi, oferece um kit com seis miniaturas para que o consumidor possa conhecer, através de uma jornada sensorial realizada na plataforma da marca, as fragrâncias mais conectadas com o seu estilo, que torna a escolha mais certeira.
Bem-estar, higiene e emoção
Segundo a WGSN, empresa global de previsão de tendências, as fragrâncias devem se tornar mais funcionais e propositadas, unindo bem-estar, higiene e emoção.
Em um discurso proferido na premiação da Fragrance Foundation no Reino Unido, Judith Gross, diretora global da IFF, explicou que as fragrâncias estimulam um modo de viver mais positivo e que durante a crise, os perfumistas da empresa reintroduziram perfumes no mercado como um item ‘essencial’ para garantir o bem-estar mental e físico do público consumidor. De fato, o estudo conduzido pela IFF em 2020, Global Lifestyle Tracker, apontou que os aromas são parte cada vez mais importante dos rituais de autocuidado, já que 54% das pessoas usam perfume em casa e não apenas para sair.
O Eau de Parfum Forest Lungs, da marca britânica The Nue Co, é uma fragrância unissex antiestresse, com a proposta de trazer os efeitos curativos da natureza. O produto replica as fitoncidas, que são compostos orgânicos voláteis emitidos por todas as partes das árvores com um papel importante na imunidade das plantas. Por isso, segundo a empresa, a fragrância reduz o estresse e a ansiedade, além de reforçar o sistema nervoso parassimpático. A marca também realiza regularmente campanhas de conscientização sobre saúde mental.
Já O Boticário lançou recentemente a fragrância Arbo Botanic, inspirada no movimento das Florestas Urbanas, no verde das folhas da Costela-de-Adão e contém o acorde ENERGY, ingrediente comprovado pela neurociência por despertar a sensação de energia que a natureza traz.
A importância do perfumista
Usar a figura do perfumista para explicar qual foi a inspiração por trás de um produto, é uma forma de criar uma relação mais humana entre cliente e criador e também, de obter maior engajamento no ambiente digital, de acordo com a WGSN.
Cursos, workshops e personalização podem propulsionar as vendas, pois é crescente a curiosidade e o interesse por ingredientes de perfumaria. Desse modo, os perfumistas se tornarão parte central do desenvolvimento de novos produtos, criando fragrâncias que, além de terem histórias e inspirações mais pessoais, irão educar o público consumidor. Exemplo da perfumaria como aliada na educação, são as escolas que usam o olfato no processo de aprendizado. A especialista em educação atuante na Noruega e no Reino Unido, Natalia Kucirkova, criou livros olfativos com mecanismos ‘raspe e cheire’ que permitem que estudantes conectem odores a novas palavras. O uso dos cheiros como ferramenta de aprendizado contribui para o fortalecimento da conexão de jovens consumidores com fragrâncias, enfatizando sua importância. Por isso, a importância dos aromas em diferentes áreas da vida, da educação até o estilo pessoal, deve ser incorporada à história e à comunicação da marca.
Novos ingredientes naturais
A WGSN ressalta que os ingredientes ‘naturais’ cultivados em laboratório darão origem a perfis olfativos inovadores. A biotecnologia branca (que usa enzimas e microorganismos, baixas temperaturas e catalisadores e solventes não-poluentes) oferece ao mercado de fragrâncias alternativas naturais e altamente sustentáveis.
O estudo Conscious Consumer, conduzido pela Firmenich, apontou que 71% dos consumidores consideram produtos naturais ou ecológicos importantes ou muito importantes. Recentemente, a empresa abriu seu primeiro laboratório de biotecnologia, em Genebra, com o objetivo de ampliar a oferta de alternativas renováveis a ingredientes naturais. Já estão nesse portfólio o Clearwood, um ingrediente com aroma de patchouli e o Dreamwood, o primeiro ingrediente biotecnológico branco a oferecer as propriedades antimicrobianas e relaxantes do óleo de sândalo, fazendo dele ao mesmo tempo funcional e sustentável.
Laboratório de biotecnologia e naturais em Genebra – Firmenich
A congruência entre a perfumaria e os aromatizadores de ambiente
Dados recentes da Mintel, empresa global de pesquisa de mercado, apontam que 25% dos brasileiros usam produtos aromáticos ambiente (velas, desodorizantes com aromas relaxantes, por exemplo), para criar um ambiente aconchegante, e esse percentual sobe para 33% entre os consumidores com 55 anos ou mais. Já um estudo global da WGSN, aponta que o estilo de vida caseiro passará por mudanças e as fragrâncias cumprirão um importante papel nesse processo. Desse modo, as fornecedoras de ingredientes de perfumaria estão lançando produtos que criam diferentes atmosferas. O Moodscentz, da Givaudan, por exemplo, é uma plataforma que combina psicologia e neurociência para criar ingredientes de perfumaria que refletem diferentes emoções.
Já consciente do efeito das fragrâncias nas emoções, o público espera que empresas invistam em produtos que criem uma atmosfera específica para momento distintos. Assim, as marcas podem considerar a ideia de criar fragrâncias para diferentes situações e cômodos da casa, já que os limites entre a perfumaria e os aromatizadores de ambientes estão desaparecendo.
O mercado de perfumes passará por grandes mudanças no pós-pandemia
As novas formas de alcançar os consumidores no mundo digital, a valorização dos perfumistas, as experiências emocionais e a neurociência, a extensão do conceito ‘natural’ através da biotecnologia são tópicos relevantes, que estão redefinindo o futuro das fragrâncias, cujo papel terá muito mais propósito.