Empreendedor funda marca de cosméticos para reaproveitar resíduos de cacau
Incubada pela Universidade de São Paulo, a Cacaus Biocosméticos venceu competição na Suíça, onde conseguiu parceria para os primeiros produtos
Durante o processo produtivo do chocolate, cerca de 85% do cacau é descartado como resíduo. Incomodado com essa constatação, o químico Fábio dos Santos decidiu trabalhar para que a indústria do chocolate deixasse de ser uma “fábrica de lixo”. Assim, fundou a Cacaus Biocosméticos, startup que produz cosméticos a partir da casca e da polpa do cacau, transformando o que é descartado em extratos com propriedades benéficas para a pele.
“Os nutrientes presentes nos resíduos, como vitaminas, minerais e aminoácidos, ajudam a pele e o cabelo a se regenerar, crescer e se fortalecer. Verificamos propriedades antioxidantes, anti-inflamatórias e antimicrobianas nos extratos”, diz o empreendedor. O subproduto é comprado de 20 pequenos produtores do sul da Bahia, que fazem mais renda, já que as cascas seriam queimadas —por serem volumosas. “Quero atingir cada vez mais produtores de agricultura familiar e fazer com que mulheres, pessoas pretas e indígenas tenham melhora na qualidade de vida”, pontua o fundador.
Nascido e criado na Bahia, Santos diz que sempre teve muito contato com o cacau. Mas foi enquanto trabalhava na Braskem e finalizava um mestrado na Universidade Federal da Bahia (UFBA), que ele viu um programa de televisão para pesquisar um novo tema de pesquisa e conheceu sobre as doenças do cacau. Mudou-se para São Paulo no ano seguinte, em 2013, para estudar o assunto em um doutorado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
“Durante esse projeto, eu comecei a interagir com os produtores de cacau, visitei as fazendas. Fui muito a Ilhéus para conhecer o processo do chocolate e vi o amontoado de casca e polpa que não eram aproveitados. Me intrigava, eu ficava imaginando as moléculas que existiam ali, como aproveitar as propriedades que teriam”, conta.
A ideia de desenvolver cosméticos teve início em 2016, quando a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) lançou um programa para jovens empreendedores pós-graduandos. Santos concorreu com o projeto de aproveitamento de uso sustentável do mel de cacau em cosméticos e chegou à final, mas a falta de experiência como empreendedor pesou na hora da decisão. “Recebi pareceres muito bons dos revisores, que viram potencial no negócio. A parte científica eu dominava bem, mas precisava desenvolver a dimensão de mercado”, relembra.
Com dificuldade para encontrar projetos de empreendedorismo nacionais, o fundador participou de programas internacionais, em países como Alemanha e Espanha, onde se capacitou. Quatro anos depois, em 2020, a Fapesp voltou para a história da Cacaus: ele recebeu um financiamento de R$ 200 mil para transformar a ideia em realidade, testando a formulação e validando o produto. “Foi a transição de uma pesquisa básica para a fabricação. Trouxemos especialistas em cosmetologia e microbiologia para desenvolver o produto, tivemos recursos para comprar materiais e insumos, para fazer testes com protocolos”, diz. Nesse momento, o negócio passou a ser incubado e acelerado pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares da Universidade de São Paulo (USP/Ipen).
Os primeiros produtos lançados, a partir do fomento da Fapesp, foram o creme facial, a loção hidratante e o creme de mãos, com propriedades antioxidantes e antimicrobianas testadas e comprovadas em laboratório. Os itens também são biodegradáveis e não contaminam a água e o solo. Com esse portfólio, a Cacaus venceu a competição da Swissnex, agência de negócios do governo da Suíça.
Após apresentar o pitch no evento, a empresa brasileira conquistou uma parceria com a suíça NOW care, startup de cosméticos naturais. “Uma das juradas do concurso nos conectou com a empresa porque sentiu que nosso produto faria sentido uma vez que a Suíça é um dos maiores produtores de chocolate do mundo”, afirma.
Atualmente, a Cacaus está com uma rodada de investimentos seed aberta para captar recursos com investidores-anjo ou fundos de venture capital, com o objetivo de levantar entre R$ 500 mil e R$ 1 milhão. O capital será utilizado para produzir e comercializar os cosméticos. A Cacaus também pretende conversar com grandes empresas produtoras de chocolate para criar parcerias.
Novos produtos já estão no pipeline, como sérum facial e água micelar. Uma linha de itens capilares, com shampoo, condicionador e creme de pentear, está em fase de finalização de testes, com previsão de lançamento nos próximos seis meses. Para aumentar a produção, Santos já mapeou 50 fazendas na região entre Ilhéus e Porto Seguro, no sul da Bahia, para adquirir os resíduos da fruta.
Fonte: revistapegn 20.07.2023