Novo material reduz custo de purificação de substâncias para a indústria
A separação da molécula-alvo de moléculas contaminantes é tarefa essencial na produção de vacinas, fármacos e cosméticos
O esforço para contornar um obstáculo tecnológico identificado durante a tese de doutorado em biotecnologia de Willian Kopp resultou no desenvolvimento de um novo material para uso em pesquisa e em indústrias – uma micropartícula magnética de sílica porosa – e deu origem à empresa Kopp Technologies.
Tudo começou em 2010, quando o pesquisador fazia seu doutorado na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) com bolsa da FAPESP. Ele buscava imobilizar enzimas para aplicações industriais utilizando adsorventes magnéticos – materiais porosos com propriedades magnéticas capazes de promover a fixação de moléculas a partir de um fluido, separando-as, assim, de contaminantes indesejados ou permitindo a recuperação seletiva e reúso de catalisadores, como as enzimas. Mas os materiais magnéticos disponíveis no mercado não atendiam às necessidades da pesquisa. “Apresentavam baixa resposta magnética, não tinham estabilidade química e, sobretudo, eram extremamente caros. Pensando em processo industrial eram inviáveis”, diz Kopp.
Ele então mudou o tema do doutorado e direcionou seu trabalho para o desenvolvimento de um adsorvente que preenchesse essa lacuna no mercado de biotecnologia. Antes mesmo de defender sua tese, em 2013, o pesquisador depositou o pedido de patente de um novo produto.
O passo seguinte foi associar-se a um administrador experiente, Maicon Vilabruna, para montar o modelo de negócios da Kopp Technologies. “O Maicon, além de sócio, tem mais de uma década de experiência em uma grande multinacional e trouxe toda essa bagagem adquirida para a Kopp. Eliminamos um dos grandes problemas que as startups enfrentam hoje que é a falta de alguém do mercado na estrutura societária, o que contribui também no processo de tomada de decisão. Em 2015 já tínhamos a empresa constituída e a patente da tecnologia licenciada para a empresa”, diz o pesquisador.
No ano seguinte, em 2016, a empresa teve aprovado no Programa FAPESP Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) projeto de desenvolvimento de uma série de processos para inserção de diferentes grupos químicos na superfície das micropartículas magnéticas de sílica para permitir sua aplicação em diferentes processos de purificação industrial.
“Estamos utilizando grupos químicos que têm afinidade com diferentes moléculas. Eles permitem a adesão dessas moléculas de forma seletiva, permitindo, assim, a purificação do produto”, resume o pesquisador. “Ao final do projeto teremos um extenso portfólio de produtos que permitirá a aplicação de nossa tecnologia em praticamente qualquer processo industrial de purificação de moléculas de interesse.”
O projeto entrou diretamente na Fase 2 do PIPE – de pesquisa para desenvolvimento do produto em escala piloto – e já teve a aprovação do relatório do primeiro ano de trabalho.
Os sócios da empresa haviam previsto o desenvolvimento de 16 produtos até agosto de 2018. Em agosto de 2017 já estavam com 27 produtos desenvolvidos e testados e, na segunda quinzena de novembro, lançaram 10 desses produtos para uso em laboratório. “No próximo ano esperamos estar vendendo também para empresas, com perspectivas de exportação para países da América Latina nos próximos dois anos”, afirma Kopp.
Existem diferenças significativas entre os processos de purificação de substâncias realizados em uma empresa e no laboratório de uma universidade. Na pesquisa acadêmica, é comum o uso de materiais magnéticos para aplicação em testes bioquímicos. Essa tecnologia, porém, é inviável para a indústria, sobretudo por uma questão de preço. “O grama do material magnético custa, em média, US$ 400, não dá para usar em escala industrial”, informa o pesquisador.
Para separar uma molécula-alvo de moléculas contaminantes – tarefa essencial na produção de vacinas, fármacos, cosméticos etc. –, a indústria recorre à filtração ou centrifugação. Assim obtém uma solução livre de sólidos em suspensão, que é, então, levada a um processo de purificação com materiais não magnéticos, como sílica porosa e outras resinas cromatográficas.
Esse processo ainda é bem oneroso. Como a indústria brasileira depende de tecnologia e de insumos importados, muitas vezes a purificação é a etapa mais cara do desenvolvimento de um novo composto químico ou bioquímico, representando cerca de 40% do custo de produção.
“Com o uso das micropartículas magnéticas, a indústria pode pular a etapa da centrifugação ou filtração, já que as moléculas de interesse vão aderir de forma seletiva ao material graças à afinidade pelos grupos químicos inseridos na superfície do material. Em seguida, o material contendo o produto pode ser fácil e rapidamente separado por meio da aplicação de um campo magnético externo. Ganha-se no custo direto e no tempo de produção, o que também gera economia”, diz Kopp.
Segundo o pesquisador, as micropartículas magnéticas de sílica que a Kopp Technologies pretende colocar no mercado terão um custo ainda menor do que os insumos não magnéticos importados, como as resinas cromatográficas.
Tecnologia disruptiva
Mas os sócios da Kopp não estão apostando apenas nas micropartículas. Eles sabem que, do ponto de vista da indústria, essa é uma tecnologia disruptiva, que rompe completamente com os processos industriais estabelecidos. Ocorre que as empresas que já contam com plantas industriais estruturadas podem não querer aposentar seus filtros e centrífugas em curto prazo.
Considerando essa possibilidade, eles delinearam algumas estratégias: colocarão o novo produto no mercado, ao mesmo tempo em que continuarão a atender o mercado tradicional.
“Vamos atuar na criação de novos processos e na adaptação dos existentes. Inserimos no modelo de negócios a prestação de serviço de consultoria no desenvolvimento de processos industriais de purificação de moléculas. E, além dos materiais magnéticos, estamos desenvolvendo também, em paralelo, tecnologias clássicas de purificação, como, por exemplo, resinas cromatográficas para uso industrial”, diz Kopp.
Ele explica que a cromatografia é, hoje, a tecnologia dominante empregada em processos de purificação industrial, porém não há produção local de resinas cromatográficas. “Dependemos 100% de tecnologias importadas. Resolvemos comprar esse desafio e, em breve, seremos a primeira empresa da América Latina a produzir colunas cromatográficas para aplicações industriais.”
Voltar a uma tecnologia clássica quando já se descobriu uma possibilidade inteiramente nova não costuma ser algo que faça brilhar os olhos de um cientista. Mas essa decisão foi tomada com os olhos no mercado, após participação dos sócios da Kopp Technologies, em 2015, no programa InovAtiva Brasil, em que foram classificados como uma das 90 empresas mais inovadoras do país. O InovAtiva é realizado pelo Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) e pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).
Fonte: Fapesp