Negras, asiáticas e latinas estão mais expostas a compostos danosos em cosméticos
Cientistas alertam para perigos da ‘injustiça ambiental e social’ que mulheres de minorias enfrentam nos EUA
Mulheres negras, latinas e asiáticas têm níveis maiores de compostos químicos relacionados a produtos cosméticos em seus organismos do que mulheres brancas, o que as deixa mais sujeitas a diversos problemas de saúde.
O alerta vem de artigo publicado nesta quarta-feira (16/08) no periódico científico “American Journal of Obstetrics and Gynecology”. Segundo os autores, os profissionais de saúde, em especial os que se dedicam à saúde reprodutiva, devem estar preparados para aconselhar as mulheres sobre a exposição a estes compostos por vezes tóxicos, além de lutar pelo estabelecimento de políticas que as protejam, e em especial as pertencentes a minorias étnicas, de substâncias químicas prejudiciais nos cosméticos e outros produtos de higiene.
“A pressão para atender a padrões de beleza ocidentais significa que as mulheres negras, latinas e asiáticas dos EUA estão usando mais produtos de beleza e, desta forma, estão expostas a níveis mais altos de compostos químicos que se sabem serem prejudiciais à saúde”, resume Ami Zota, professora de saúde ambiental e ocupacional na Universidade George Washington, EUA, e uma das coautoras do artigo. O uso de produtos de beleza é uma fonte crítica, porém subvalorizada de danos à saúde reprodutiva e injustiça ambiental.
Zota e sua coautora, Bhavna Shamasunder, da Faculdade Ocidental de Los Angeles, destacam que a indústria de produtos de beleza tem uma receita global de mais de US$ 400 bilhões anuais e que estudos anteriores mostraram que as mulheres negras, latinas e asiáticas dos EUA gastam mais dinheiro com cosméticos do que a média nacional, principalmente porque seu marketing enfatiza um padrão europeu de beleza. Assim, elas acabam comprando produtos como cremes para clarear a pele do rosto que frequentemente contêm ingredientes como esteroides tópicos ou mercúrio, um metal tóxico, afirma Zota.
As autoras também lembram que as mulheres negras frequentemente sofrem maior ansiedade por terem “cabelo ruim”, o que faz com que tenham o dobro de chances de enfrentarem pressões sociais para alisá-lo. E alisantes ou relaxantes capilares são mais passíveis de conter o hormônio feminino estrogênio, o que pode provocar um desenvolvimento reprodutivo precoce nas meninas negras e o surgimento de tumores uterinos.
Outros estudos também já alertaram que produtos cosméticos e de higiene podem conter múltiplos compostos químicos “escondidos” que já foram ligados a problemas endócrinos, reprodutivos ou no desenvolvimento. Estas substâncias podem ser especialmente perigosas para mulheres na faixa dos 18 aos 34 anos, justamente as que mais compram produtos de beleza, numa média de mais de dez por ano. Tais mulheres e seus filhos podem então estar mais vulneráveis a estes compostos, ainda mais se a exposição ocorrer em épocas sensíveis, como durante a gestação.
A propaganda também tem encorajado as mulheres negras a usarem mais produtos de banho com mensagens que falam de sujeira e odores. Um estudo feito por Zota e colegas em 2016 revelou que, numa amostragem nacional de mulheres em idade reprodutiva, aquelas que tomavam banho com mais frequência tinham uma exposição 150% maior a uma substância danosa conhecida como DEP. Este composto químico, frequentemente encontrado em cosméticos perfumados, podem causar defeitos congênitos nos bebês e também foram ligados a problemas de saúde em mulheres, diz Zota.
Ao mesmo tempo, pesquisas indicam que mulheres negras de baixa renda são mais passíveis de viverem em ambientes com altos níveis de poluentes contaminando o ar, o solo e a água. Assim, estas mulheres não apenas usam mais produtos de beleza como podem também estarem mais expostas a compostos químicos tóxicos simplesmente por morarem em lares e vizinhanças mais poluídas.
“Para mulheres que já vivem em vizinhanças poluídas, os compostos nos produtos de beleza podem se somar a um fardo geral maior de exposição a substâncias tóxicas”, diz Bhavna Shamasunder, professora do Departamento de Políticas Urbanas e Ambientais da Faculdade Ocidental. “Certos grupos étnico-raciais podem estar sistemática e desproporcionalmente expostos a compostos em cosméticos porque fatores como o racismo institucionalizado podem influenciar no uso destes produtos”.
No artigo, as autoras alertam que exposições múltiplas a substâncias nos cosméticos e no ambiente se acumulam e podem interferir na saúde reprodutiva e no desenvolvimento das mulheres. Elas defendem que os profissionais de saúde ajudem a lutar por “justiça ambiental e social” se preparando para o aconselhamento sobre os riscos das exposições a estes compostos “escondidos” nos cosméticos. Elas também querem que os profissionais de saúde e pesquisadores lutem por políticas de proteção, como melhores testagens e mais transparência sobre a composição dos produtos de beleza.
Fonte: O Globo