É inegável a existência de um certo preconceito para com homens que usam maquiagem, mas esse comportamento parece ignorar as origens históricas dos cosméticos.
Na antiguidade, babilônios, assírios, egípcios e romanos já usavam, por exemplo, sombras, delineadores e henna para tingir e ornamentar a pele. Atualmente, com o advento não tão recente dos metrossexuais, esse uso de cosméticos pelos homens volta a ser uma prática cada vez mais comum.
A beleza e o conceito do belo é uma construção social que se encontra em constante transformação. A professora, jornalista e historiadora Ana Carlota Regis Vita, em sua obra intitulada “História da maquiagem, da cosmética e do penteado: versão para o século XXI” descreve as mudanças das práticas, usos e costumes da humanidade, desde a pré-história até a atual década de 2020. E se engana quem ainda tem a mentalidade de que o universo da beleza consiste em um território exclusivo do público feminino, seus ornamentos, pinturas e preocupações. Basta observar, por exemplo, a maquiagem carregada usada por homens no Antigo Egito para evidenciar a presença do masculino no âmbito da beleza.
Ana Carlota relata, ainda, que os meios de comunicação modernos insistem em apresentar um padrão, um modelo de beleza masculina que tem sua base nos corpos musculosos, com peles perfeitamente bem cuidados, ausência de pelos e cortes de cabelo que sigam sempre as últimas tendências da moda. Entende-se, então, que a figura rude do macho alfa perdeu espaço para um novo modo de exercer e manifestar a masculinidade, apresentando um comportamento mais refinado e um indivíduo mais preocupado com a beleza. Entra em cena, como descrevem Flocker (2004) e Garboggini (2008), o metrossexual.
Para demonstrar como a cultura influencia a supervalorização desse ideal de beleza masculina, Pope4 (2000) realizou uma pesquisa na qual descreve um crescimento no interesse dos homens pela busca de um corpo que seja considerado musculoso e viril, características normalmente associadas à masculinidades e apresentadas aos meninos desde a mais tenra infância através das figuras de super-heróis, por exemplo. No decorrer das décadas de 2000 e 2010, no entanto, é possível notar um movimento denominado pós-moderno, no qual uma série de conceitos passam por uma transformação e um processo de ressignificação, principalmente no que diz respeito a valores e identidade. Os modelos a serem seguidos passaram a ser, como define Bauman (2001), mais líquidos, inconstantes e escorregadios.
Esse fenômeno de busca constante pela inovação sobre os conceitos e estereótipos, alimentado e potencializado pelas mídias e redes sociais, fez com que o metrossexual se tornasse a forma mais atualmente aceita e valorizada do padrão de beleza masculina. Vale destacar que o termo “metrossexual” foi criado pelo jornalista Mark Simpson, aparecendo pela primeira vez no ano de 1994 em um texto escrito por ele para o jornal inglês The Independent.
Segundo o professor de Visagismo Robson Trindade, é nesse contexto que o uso de cosméticos e maquiagens pelo público masculino volta a ser uma prática amplamente difundida e aceita na sociedade. Cuidar da aparência, usar produtos para a pele, realizar procedimentos estéticos, buscar uma consultoria visagista, se preocupar com as roupas e estar por dentro dos padrões e tendências da moda não são e não podem ser vistos como atividades femininas. De fato, empresas de cosméticos como a gigante Chanel e as grandes brasileiras como Natura e O Boticário, por exemplo, já estão há tempos de olho nesse expressivo mercado de beleza masculina. De acordo com o relatório da Research & Markets7, citado pelo portal da Revista Forbes8, o mercado global de beleza masculina chegou a movimentar cerca de 57 bilhões de dólares em 2017, com previsão de ultrapassar a marca dos 78 bilhões em 2023. No Brasil, de acordo com a Euromonitor, as vendas de produtos de beleza para homens cresceram 70% entre os anos de 2012 e 2017.
Ainda de acordo com Robson Trindade, existem e provavelmente sempre existirão aqueles homens mais resistentes aos cuidados com o corpo, pelos mais diversos motivos, mas não se pode negar o fato de que é cada vez mais comum encontrar o público masculino inserido no mundo da beleza, seja em uma loja especializada comprando produtos para cuidar de si, em cursos voltados ao tema, ou diante de um profissional visagista conhecendo mais sobre sua própria identidade e aprendendo a expressar a plenitude de sua imagem, conclui Trindade.