Avon: A ambição global da Natura
A empresa brasileira que nasceu há meio século como um pequeno laboratório de manipulação está se tornando um gigante dos cosméticos no mundo.
Sob o codinome Apple, um projeto sigiloso mobilizou os principais executivos da fabricante de cosméticos Natura do final de 2017 para cá. Desde então, eles produziram e encomendaram milhares de páginas de estudos confidenciais sobre as vantagens e os percalços decorrentes de uma possível união de três empresas — Nectarine, Blueberry e Apricot — com uma quarta, maior que todas as demais juntas, identificada apenas como Apple. O efeito imediato da inclusão da maçã nessa salada de frutas seria a criação de uma das maiores empresas de cosméticos do mundo. A linguagem cifrada faz parte do ritual de toda grande transação de fusão e aquisição na tentativa de manter a informação restrita às partes envolvidas.
Em setembro do ano passado, porém, uma reportagem do jornal americano The Wall Street Journal revelou que, nos bastidores, a companhia brasileira analisava a compra das operações internacionais de uma rival histórica, a Avon — ou a maçã das negociações, que ainda se arrastaram por mais oito meses. No dia 22 de maio, depois de uma maratona de 36 horas quase ininterruptas de acertos finais, a transação foi confirmada após o fechamento da bolsa de valores.
O negócio criou a quarta maior empresa do mundo exclusivamente dedicada ao mercado de cosméticos, com vendas conjuntas de quase 11 bilhões de dólares em 2018. À frente dela estão apenas a francesa L’Oréal, com larga vantagem, a americana Estée Lauder e a japonesa Shiseido. Se consideradas as fabricantes de bens de consumo Unilever, anglo-holandesa, e Procter & Gamble, americana, que também atuam nesse segmento, a nova companhia é a sexta do mundo no setor. Antes do negócio, a Natura não figurava nem entre as dez maiores. Chama a atenção também o perfil multicanal da nova companhia, que terá 40.000 funcionários em 100 países, além de uma força de vendas de 6,3 milhões de revendedoras (a maioria) e revendedores independentes e uma rede de 3 300 lojas.
A soma leva em conta as operações de toda a Natura & Co, que hoje compreende a Natura — a Nectarine das negociações —, a rede de lojas australiana Aesop (Apricot), comprada em 2013, e a britânica The Body Shop (Blueberry), adquirida da francesa L’Oréal há dois anos por 1,1 bilhão de euros. Na configuração final, os fundadores — Luiz Seabra, Guilherme Leal e Pedro Passos — mantêm o controle, com o equivalente a 45% do capital. Sujeita à avaliação de órgãos reguladores e de acionistas minoritários, a aprovação da compra ainda pode levar de seis meses a um ano. A primeira reação do mercado ante o negócio foi positiva. As ações da Natura subiram 9,4% no dia do anúncio — e já valorizaram quase 40% no ano com a expectativa do desfecho da transação. “A valorização precificou os ganhos esperados com a sinergia entre as operações”, diz Thiago Macruz, analista do Itaú BBA.
A aquisição coloca a Natura diante de uma série de situações inéditas. Pela primeira vez, parte substancial das vendas do grupo terá sua origem fora do Brasil. Antes da compra da The Body Shop, quase dois terços do faturamento da Natura vinham do mercado interno. A relação deverá se inverter após a incorporação da Avon, que atua diretamente em 56 países (a operação da América do Norte, que concentrava boa parte dos problemas e prejuízos da companhia centenária, ficou fora da transação e foi vendida em abril à divisão de cuidados pessoais da sul-coreana LG).
Após mais de três décadas de esforço para se internacionalizar organicamente, com pouco resultado fora da América Latina, a Natura passa, de uma hora para a outra, a ter uma presença verdadeiramente global. Para efeito de comparação, a empresa brasileira com mais presença global, de acordo com uma pesquisa elaborada pela Fundação Dom Cabral, é a paulista Stefanini, de tecnologia, com 39 subsidiárias no exterior. A segunda colocada, a fabricante de motores elétricos catarinense WEG, tem 29. A terceira, a fabricante de ônibus gaúcha Marcopolo, 23.
Entre as mais internacionalizadas do país, numa lista que leva em conta outros fatores, como parcela de receitas vindas de operações lá fora, a líder é a companhia catarinense de não tecidos Fitesa. Entre as 40 maiores há uma única do setor de bens de consumo, a Alpargatas, dona da marca Havaianas. “Boa parte das integrantes da lista atua em mercados ligados a commodities”, afirma a professora Livia Barakat, responsável pelo levantamento da Dom Cabral. “Assim como a Havaianas, a marca Natura conseguiu se apropriar de atributos valorizados e inerentes ao Brasil. Isso pode facilitar a entrada de seus produtos no mercado global.”
Com a Avon, a Natura coroou uma das mais ambiciosas e meteóricas estratégias de internacionalização de uma companhia brasileira. No que se refere à compra de marcas globais icônicas, o paralelo mais próximo está na trajetória do trio de empresários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira, que são fundadores do fundo 3G Capital, que na última década arrematou a rede de lanchonetes Burger King e as fabricantes de alimentos Kraft e Heinz, todas americanas — e passou, aliás, a ter questionada sua capacidade de digerir os investimentos com sucesso e fazê-los crescer.
Uma diferença torna o movimento da Natura único: faz parte de uma estratégia pensada para criar uma rede global capaz de levar a marca Natura para o mundo. Nas análises realizadas internamente, há diversas projeções sobre como aproveitar a plataforma global de lojas e consultoras do grupo para internacionalizar a marca criada em 1969, quando o jovem Luiz Seabra decidiu vender um Fusca para abrir um pequeno laboratório de cosméticos manipulados em São Paulo.
Tanta ousadia parece contrastar com a visão que o mercado por muito tempo atribuiu à companhia, considerada cautelosa em sua estratégia de crescimento, tanto em relação à entrada em novos canais quanto à expansão geográfica. “Por anos, devido a outras prioridades, a frente da internacionalização foi andando meio de lado”, diz Guilherme Leal a EXAME. “Mas, se você quer aprender a nadar, uma hora terá de pular na piscina. Foi o que fizemos desde a compra da The Body Shop.
Esse mergulho trouxe, além de uma escala inédita ao negócio, desafios com dimensões proporcionais. Devido à enorme sobreposição de negócios da Natura e da Avon na América Latina, ambos baseados numa ampla rede de revendedoras porta a porta, a Natura terá de realizar a primeira integração de sua história. Até agora, nos casos da Aesop e da The Body Shop, ancoradas em redes de lojas, com pouca duplicidade operacional com a Natura, o grupo tinha mantido as operações completamente separadas.
No caso da Avon, apenas as áreas comercial e de desenvolvimento de produto deverão permanecer independentes. O objetivo, nesse caso, é garantir a preservação de identidade e posicionamento mercadológico distintos — e complementar, já que o preço médio da marca Avon é um pouco inferior ao da Natura. Os ganhos estimados com a integração, sobretudo nas áreas de produção, logística e distribuição, são estimados em até 250 milhões de dólares por ano. É um potencial a ser atingido em até 36 meses após a aprovação do negócio. A Natura anunciou que deverá reinvestir esse dinheiro na operação, que passará à liderança isolada do mercado brasileiro de beleza, com mais de 16% de participação. Hoje a Natura já é líder, com 11,9%, com uma diferença apertada em relação à Unilever e ao grupo O Boticário, que dobrou as vendas na última década justamente com a entrada na seara da Natura e da Avon: a venda direta.
Tudo ao mesmo tempo
Além da integração, a Natura terá de conduzir duas reestruturações simultâneas. Uma delas já está em curso na The Body Shop, que apresentava faturamento e lucro em queda nos anos anteriores à aquisição. A percepção era que a marca havia perdido o apelo original desde a morte da fundadora, a inglesa Anita Roddick, em 2007. A Avon promete ser um desafio tão ou mais complicado. A marca sofre uma decadência há quase uma década. A Avon figurou na lista das 100 marcas globais mais valiosas, da consultoria especializada Interbrand, de 2001 a 2013, quando ocupava a 87a posição. Seu pico de valor de marca foi de 5,4 bilhões de dólares, registrado em 2011. Dois anos depois, a companhia já havia perdido 20% do valor, quando, então, deixou de figurar na lista.
No Brasil, perdeu relevância ao cair para o sexto lugar no setor de higiene e beleza. Há uma década, disputava a liderança justamente com a Natura. A Avon já chegou a valer 20 bilhões de dólares no início da década. Com o prêmio de 28% sobre a cotação da empresa pago pela Natura aos acionistas, a Avon vale 3,7 bilhões de dólares. As operações consolidadas deverão resultar numa companhia com valor de mercado estimado de 11 bilhões de dólares.
Há pelo menos três fatores que, segundo os fundadores da Natura, dão confiança de que essa jornada trará bons resultados. O primeiro tem a ver com os resultados obtidos até agora com a The Body Shop, o que seria uma demonstração da capacidade de execução da nova holding. A marca britânica de 43 anos de existência passou por uma revitalização nas mãos da Natura com o intuito de resgatar sua essência ativista.
No momento da aquisição, dois anos atrás, a Natura havia anunciado projeções para dobrar o Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) da The Body Shop até 2022. No ano passado, o avanço foi de 38%, acima da meta para o período, segundo Roberto Marques, presidente executivo do conselho de administração da Natura & Co. Uma das medidas tomadas foi o fechamento de lojas deficitárias. As vendas cresceram 168% com mudanças na linha de produtos. “Essas medidas foram identificadas ainda no trabalho pré-aquisição”, afirma Marques. Segundo a análise da empresa especializada em investimentos Eleven Financial, o resultado indica capacidade de execução e joga a favor das perspectivas de virada na Avon.
O segundo trunfo, reconhecido por analistas, está na natureza das mudanças necessárias na Avon, similares às implementadas nos últimos dois anos na própria Natura para recuperar os resultados na operação local. Nesse período, a Natura concentrou-se num esforço para digitalizar as vendas, tanto ao turbinar as transações pelo site quanto ao criar uma central de atendimento para as consultoras. Elas foram segmentadas por desempenho e passaram a receber benefícios de acordo com o que entregam. Num cenário de crise econômica, as vendas caíram 1% no primeiro trimestre deste ano no Brasil em relação ao mesmo período de 2018. Mas a empresa continuou a ganhar participação de mercado.
De acordo com um relatório publicado pela consultoria Euromonitor, a Natura manteve a liderança do mercado brasileiro de cosméticos, fragrâncias e higiene pessoal pelo segundo ano consecutivo, com participação de 11,9%, acima dos 11,4% registrados em 2017. O primeiro trimestre também foi o décimo período consecutivo de ganhos de produtividade pelas consultoras, demonstrando o vigor do modelo de segmentação das consultoras e o avanço de sua plataforma digital.
Também conta a favor o fato de que alguns passos na mesma direção já começaram a ser dados pela atual gestão da Avon, comandada no Brasil por José Vicente Marino, que foi vice-presidente comercial da Natura entre 2008 e 2015. Marino foi contratado em setembro do ano passado pelo presidente da Avon internacional, o holandês Jan Zijderveld. Zijderveld também é, ele mesmo, um recém-chegado. Escolhido em janeiro de 2018 para comandar a reversão dos resultados em queda, ele veio da Unilever para implementar um amplo programa de reestruturação da Avon fora dos Estados Unidos.
O Brasil está no topo de sua lista de prioridades, já que é hoje a maior operação da Avon internacional, à frente do México e da Rússia. Com a ajuda de um diagnóstico elaborado pela consultoria McKinsey, Marino definiu seis pilares para a virada, os quais abarcam todos os aspectos do negócio, desde a criação de incentivos para a força de vendas até a simplificação da estrutura hierárquica e a reformulação da linha de produtos. Ao todo, são 590 iniciativas em andamento.
Todas as frentes são acompanhadas por uma diretora de transformação com dedicação exclusiva para seguir os projetos, pescada na fabricante de eletrodomésticos Whirlpool. Cada projeto tem um responsável que presta contas semanalmente sobre seu andamento. Um software mostra o status dos projetos, um a um, num placar que diz quais são as pendências existentes. “A Avon se perdeu numa estrutura complexa e burocrática”, afirma Marino. “É preciso resgatar a conexão com o mercado.” Apesar de tantos problemas, ele considera que a imagem da marca se manteve resiliente na cabeça das consumidoras. “Numa pesquisa, identificamos que a Avon é reconhecida e bem-vista no país inteiro.”
A companhia, que nasceu nos Estados Unidos há 130 anos, foi uma das precursoras da venda direta no Brasil, onde atua desde 1952. Assim como fez a Natura, o plano de reestruturação de Marino segmentou os incentivos às revendedoras conforme o desempenho que apresentam. Na frente da redução de pessoal, 200 dos 1.500 funcionários da sede em São Paulo foram demitidos. Um nível hierárquico foi eliminado de todas as áreas. Cerca de 30% da linha de produtos também acabou cortada, em busca de foco. Há mudanças previstas até na simplificação das fórmulas dos produtos. Em uma de suas três visitas ao país, Zijderveld disse que, enquanto um produto da Avon tem em média 40 itens em sua formulação, o elaborado em companhias mais eficientes do setor tem metade disso com o mesmo efeito final.
Marino assumiu o compromisso de completar em 2021 a transformação da Avon, cujas metas não são divulgadas. Antes disso, porém, a Natura já terá obtido a aprovação para iniciar a integração das operações. “Vamos continuar a vida normalmente até que o negócio seja formalizado”, afirma Marino. “Nosso compromisso é entregar os resultados a que nos propusemos inicialmente.” Os executivos que conduzirão a mudança dali para a frente ainda não foram nomeados. Mas o organograma do topo já está definido pela Natura. Haverá um presidente responsável por Natura e Avon na América Latina. E outro pelas operações nos demais países.
A união de 4.000 funcionários da Avon no Brasil com cerca de 6.000 da Natura, além das equipes de outros países da América Latina, pode esbarrar no choque cultural de duas organizações tão distintas. Segundo especialistas, eis um ponto frequentemente subestimado que costuma atrasar a obtenção de sinergias em processos de fusões e aquisições. Uma pesquisa com 121 executivos brasileiros que participaram de um processo de fusão ou aquisição em 2018, feita pela consultora Betania Tanure, mostrou que 53% das uniões não atingem os resultados esperados. A principal causa está nos desencontros culturais. “Em geral, essas questões são minimizadas num primeiro momento”, afirma Betania, especializada em comportamento organizacional. “A maioria dos processos de integração só considera esse tema quando os problemas aparecem.”
Os presidentes avaliam, em média, que em sete meses a integração está resolvida. Os gerentes, porém, que vivenciam a colisão de times no dia a dia, afirmam que passados os meses iniciais é que vem o pior momento. Integrar de maneira harmônica times que historicamente sempre se digladiaram pela liderança costuma ser ainda mais difícil. É uma provação pela qual a Natura ainda não passou em sua história de 50 anos.
Marques reconhece o tamanho do desafio. A ideia, segundo ele, é identificar um responsável pela integração com dedicação exclusiva, de modo que o trabalho não tire a atenção do dia a dia. O plano de integração — incluindo a escolha das pessoas para ocupar os novos postos — será detalhado nos próximos meses e deverá estar pronto para ser implementado assim que a Natura puder ter influência na gestão da Avon.
Concluir a reestruturação de duas marcas globais em dificuldades, fazer uma enorme integração de operações entre duas rivais gigantes na América Latina, não perder o foco no dia a dia em mercados com baixo crescimento, como o Brasil, cheios de novos e ágeis concorrentes. Paradoxalmente, a cúpula da Natura tem buscado o antídoto para lidar com a realidade cada vez mais complexa do grupo na simplicidade de uma estrutura corporativa quase virtual. A lógica é dar autonomia decisória e certa independência às empresas.
O modelo funciona num comitê composto de executivos das próprias companhias, criado em setembro de 2017 e comandado por Marques, que fez carreira internacional em grandes empresas de consumo americanas. Quando passou a compor o conselho da Natura, em 2015, ainda era presidente da operação da fabricante de alimentos Mondelez para a América do Norte. Há dois anos, deixou a posição e assumiu a presidência executiva do conselho de administração, após a compra da The Body Shop.
Sua missão principal é articular as sinergias entre as empresas do grupo e aproximar as decisões das empresas do conselho. Leia-se: dos três fundadores, que se dividem de maneira ativa na copresidência do conselho de administração. “Como sou um conselheiro, essa governança permite a conexão entre o comitê e o conselho, que tem um papel mais ativo neste momento”, afirma Marques. Numa demonstração dessa postura atuante, os fundadores embarcaram para Nova York no início de junho a fim de participar de uma semana de encontros para a elaboração do planejamento estratégico do grupo junto com os executivos.
No comitê operacional ligado a Marques, o único executivo com dedicação exclusiva é Robert Chatwin, que antes havia sido vice-presidente de internacionalização da Natura por cinco anos. Na posição, Chatwin é responsável por organizar e dar ritmo à busca de sinergias. Após a compra da Avon, a companhia anunciou que vai criar um segundo cargo com dedicação exclusiva: o de diretor de crescimento, ainda sem ocupante definido. A ideia é que esse profissional dê consistência às estratégias de expansão das marcas nos mais variados países.
Aos poucos, o novo grupo assume uma rotina cada vez mais próxima à de uma companhia global. O comitê comandado por Marques realiza seis encontros presenciais por ano. O local varia. O primeiro neste ano aconteceu em São Paulo. Mas já houve ocasião em que ocorreu em Londres. A capital inglesa também abrigou a primeira reunião de conselho da Natura fora do Brasil, no início de 2018, na sede da The Body Shop. As viagens internacionais de executivos tornam-se cada vez mais frequentes dentro da nova realidade. “Voltei à rotina que tinha no tempo de Unilever”, diz João Paulo Ferreira, presidente executivo da Natura. Ele trabalhou duas décadas na subsidiária brasileira da companhia anglo-holandesa, até mudar para a Natura para cuidar da logística em 2009.
O inglês já se tornou o idioma oficial das reuniões de conselho com a chegada de conselheiros estrangeiros. Desde 2018, há dois integrantes com esse perfil: a empreendedora americana Jessica Herrin, fundadora de empresas no segmento de moda e beleza, e Ian Bickley, que entre outras atividades é conselheiro da marca de calçados Crocs, dona de uma ampla rede de lojas no mundo. “Ganhamos confiança por ter com quem debater decisões de uma empresa global”, afirma Guilherme Leal.
Há pelo menos dois exemplos mais evidentes de que a articulação feita por essa “fina camada corporativa”, como é chamada internamente, tem funcionado. Um deles é a decisão de incorporar as operações da The Body Shop na América Latina à estrutura da Natura no Brasil. “Decidimos aproveitar o conhecimento que a empresa tem da região e usar a operação local como uma espécie de masterfranqueada da The Body Shop”, diz Ferreira. O segundo exemplo é a abertura, prevista para o segundo semestre deste ano, da primeira loja da Natura na Ásia, por meio de um masterfranqueado da marca The Body Shop no continente.
Segundo EXAME apurou, a ideia é já começar com venda direta em paralelo à abertura da loja. O plano é usar redes sociais e o próprio esforço de atração de revendedoras para tornar a marca conhecida. “A revolução digital proporciona hoje uma velocidade muito maior à globalização das marcas”, diz Beto Almeida, presidente da consultoria Interbrand no Brasil. “O desafio da Natura será construir relevância, autenticidade e diferenciação”.
Mais do que nunca, as eventuais conquistas ou os tropeços da nova Natura devem se dar sob os olhares atentos de investidores internacionais. A companhia resultante da troca de ações com a Avon terá capital aberto na B3, mas também ADRs na Bolsa de Valores de Nova York. Cerca de 25% de participação da nova companhia estará nas mãos de acionistas minoritários da Avon. Num histórico recente, um grupo de fundos se uniu para pressionar por mudanças, que culminaram na contratação do atual presidente e até no próprio processo de venda da Avon.
A valorização das ações da Avon International na bolsa de Nova York mostra que existe certo otimismo no mercado com a compra da companhia pela Natura, um investidor estratégico, que decidiu assumir o controle da operação. “Como o negócio se deu pela troca de ações, o processo de compra da Avon foi também um processo de venda”, diz Marques. “Tivemos de convencer parte dos minoritários de que valia a pena eles se associarem à Natura e se tornarem sócios da nova companhia.” O bloco de controle, nas mãos dos fundadores, mantém uma margem confortável para continuar tomando as decisões. Na nova companhia, a Natura poderá indicar dez conselheiros, enquanto a Avon terá direito a três assentos. É um passo importante na sofisticação da prestação de contas das decisões e dos resultados da Natura daqui para a frente. Tornar-se global tem seu glamour. Mas também tem seu preço.
Fonte: Exame 06.06.2019