Multinacionais ampliam aposta em higiene pessoa
Segmentos já são robustos e têm potencial para continuar crescendo no país
Multinacionais que atuam no mercado brasileiro têm ampliado investimentos no portfólio de higiene pessoal e de limpeza para casa, além de segmentar as demais linhas de negócio. É o caso da Unilever, que fez a cisão mundial da divisão de sorvetes, e da Kimberly-Clark, que busca se firmar como empresa de cuidados pessoais após vender seu portfólio de papel higiênico (tissue) para a Suzano.
Para analistas, os mercados brasileiros de higiene e limpeza ainda apresentam espaço para crescimento, mesmo com o tamanho já robusto. Com o preço sendo fator central na decisão de compra, as estratégia das companhias incluem aumentar a percepção de valor dos produtos com formulações mais nobres, independente do tíquete médio, e disputar diferentes faixas de preço.
“A tendência para 2024 é o consumidor caçador de valor, que busca o quanto tem de benefício em relação ao que foi pago pelo produto. Ele quer o máximo de benefício pelo menor preço possível, o que não é necessariamente o mais barato”, explica Mariana Teixeira, analista da Euromonitor para beleza e cuidados pessoais.
O diretor da divisão de cuidados com as roupas e com a casa da Unilever, Marcelo Costa, diz que o Brasil é um mercado estratégico para a companhia. De acordo com o executivo, a receita da empresa a nível global é composta de forma similar por suas quatro divisões de negócio. Os resultados operacionais e financeiros do primeiro trimestre deste ano apontam que as divisões de cuidados pessoais e de nutrição faturaram € 3,4 bilhões cada, seguidos pelo setor de cuidados com a casa, cuja receita trimestral foi de € 3,2 bilhões. A menor fatia foi a de sorvetes que faturou € 1,8 bilhão. A Unilever pretende se desfazer da operação global de sorvetes até o fim de 2025.
Já no Brasil, segundo Costa, o faturamento de produtos de limpeza é “muito superior” aos demais negócios, o que explica o potencial estratégico do país. A empresa não abre números da receita regional.
Relatório do Jefferies, publicado em março, destacou que a Unilever opera preços acima do mercado na Europa. A diferença de preço, na avaliação dos analistas, deve abrir espaço para que a companhia perca participação de mercado ante os concorrentes. O cenário brasileiro, no entanto, indica para um consumidor mais atento a custo-benefício do que preços indiscutivelmente baixos, segundo Costa.
Esse comportamento, segundo ele, sustenta as vendas de marcas como da Omo, líder de vendas por 31 anos consecutivos. Já para os períodos com maior inflação e perda do poder de compra, a companhia trabalha a estratégia de marcas mais acessíveis do portfólio, como Ala e Surf. O executivo relembra que o período da pandemia de covid-19 foi marcado por uma escalada de custos de ingredientes e do diesel na cadeia logística, o que acirrou ainda mais o debate sobre preços no setor.
Os reveses econômicos que acompanharam o auge da pandemia, segundo a analista da Euromonitor para higiene pessoal e beleza, Mariana Teixeira, também levaram a Unilever a brigar mais pela preferência do consumidor no segmento de cuidados básicos. A analista aponta que a estratégia da companhia, similar aos produtos de home care, também foi buscar uma maior percepção de valor em seus produtos. “Durante a pandemia houve um choque negativo, com as pessoas querendo gastar menos em cuidados pessoais. A resposta da Unilever veio com essa ramificação da atuação e ao trazer novos ingredientes e formulações”, afirma.
Na avaliação de Amanda Caridad, analista sênior da consultoria Mintel, movimentações do tipo sinalizam o potencial estratégico do país para os mercados de higiene e beleza. “O Brasil é o quarto maior mercado de beleza e cuidados pessoais no mundo, e apesar do contexto macroeconômico desafiador, ele tem mostrado um forte crescimento em receita”, observa.
Mariana Teixeira, da Euromonitor, diz ainda que a segmentação de negócios que a Unilever fez com a cisão de sorvetes é uma tendência de mercado. A especialista cita, como exemplo, a criação da Kenvue a partir da cisão do portfólio de cuidados pessoais da Johnson & Johnson. “A diversificação foi uma estratégia importante para que as companhias se mantivessem relevantes no mercado como um todo, mas diversificar colocando tudo dentro de um mesmo bojo não se mostrou a decisão mais eficiente.”
Além das duas multinacionais, a concorrente Kimberly-Clark reviu o portfólio e se desfez em dezembro dos ativos de tissue no Brasil, como papel higiênico e papel toalha. Após vender as marcas à Suzano, a companhia pretende se firmar nas categorias de higiene pessoal para bebês e cuidado íntimo. “A gente busca ter produtos com tecnologias patenteadas. Teremos muitas novidades em termos de relançamentos e reposicionamentos”, afirmou ao Valor em janeiro o presidente das operações brasileiras, Cláudio Vilardo.
Com a revisão de portfólio, segundo o executivo, cerca de 40% dos negócios da companhia estão atualmente no canal de farmácias.
O analista da Euromonitor para higiene e tissue, Michel Piroutek, aponta que o Brasil tem faturamento relevante em segmentos como fraldas e cuidados menstruais, o que tem sido uma das apostas da Kimberly-Clark. “O Brasil está crescendo em faturamento nessa categoria a nível global, está em quinto lugar e tem perspectiva de alcançar a quarta posição. Também há uma via importante de investimentos em produtos para incontinência urinária. O que as empresas como a Kimberly-Clark têm feito é conscientizar o consumidor e diminuir o estigma desses produtos”, afirma.
A companhia havia anunciado, em janeiro, um aporte de US$$ 100 milhões que incluía a ampliação de 40% da capacidade de produção de sua fábrica em Camaçari (BA), responsável pelo portfólio de absorventes e fraldas.
Fonte: Valor 12.06.2024