Venda de desodorantes fracassa na China
A Unilever trouxe seu desodorante Rexona para a China há uma década, sonhando com um mercado de 2,6 bilhões de axilas. Os salários estavam aumentando, os consumidores estavam gastando e o país se preparava para receber os Jogos Olímpicos de Pequim, em 2008. A lógica indicava que mais chineses estariam abertos a um produto ocidental de higiene.
“Criamos bons mercados para o Rexona a partir do zero em muitos países, e não víamos qualquer fator que nos impedisse de fazer o mesmo na China”, disse Frank Braeken, ex-diretor da Unilever no país.
Mas diferenças culturais e características biológicas frustraram esses planos. As vendas somaram apenas uma fração do orçamento de marketing do Rexona para a China, disse Braeken. Hoje, estimativas calculam que menos de 10% da população chinesa usa desodorante, e o produto pode ser difícil de encontrar fora das principais cidades.
A crescente classe consumidora da China tem trazido bons ventos para marcas ocidentais como Starbucks e KFC. Mas entre as tentativas de conquistar os consumidores chineses houve fracassos notáveis. Os absorventes íntimos internos, por exemplo. A maioria das chinesas considera os absorventes internos demasiadamente invasivos. Em 2016, foram gastos US$ 136 milhões em absorventes internos na China, apenas uma fração dos US$ 4,9 bilhões em vendas anuais de absorventes externos no país, de acordo com dados da firma de consultoria Mintel.
Empresas como Apple e Starbucks prosperaram vendendo aos consumidores chineses produtos que lhes permitem mostrar ao mundo que “chegaram lá”. “O desodorante não faz sucesso, em parte, porque é invisível”, disse o economista independente Ye Tan, de Xangai.
O profissional de mídia Cai Qianyi, 38 anos, de Pequim, começou a usar desodorante em 2006, enquanto estudava na França. Mas a maioria de seus parentes e amigos não faz ideia do que seja desodorante.
Quando as fabricantes de desodorante começaram sua tentativa de entrada na China, elas destacaram o constrangimento causado pela transpiração.
Essa abordagem não funcionou na China, disse Lucia Liu, que esteve envolvida no marketing do Rexona entre 2011 e 2016. “Aqui, a mentalidade tradicional diz que a transpiração é positiva, pois ajuda a desintoxicar o corpo”, disse ela.
Mas há outra razão pela qual poucos consumidores chineses compram desodorante: questões elementares de biologia. Nos anos mais recentes, cientistas mostraram que muitos no Leste da Ásia possuem um gene que reduz a probabilidade de “odor axilar humano”, descrição científica do mau cheiro típico do corpo humano.
As empresas que pretendem vender desodorante na China precisam apelar para outros sentidos. A marca Nivea, que pertence à alemã Beiersdorf A.G., tentou atrair as consumidoras chinesas com o lançamento de desodorantes com função de branqueamento, para atender a um mercado onde a pele mais clara costuma ser associada a certo status social.
A Unilever usou uma série de táticas tradicionais de marketing, mas, analisando hoje, todas parecem um pouco fora de sintonia com o público. Num anúncio impresso do Rexona, um pistoleiro (cuja axila paira sobre a cena, em primeiro plano) parece derrubar o adversário sem tocar no revólver. Em outro, um boxeador parece derrubar o oponente com o cheiro.
Ng Tian It, de Cingapura, encarregado da supervisão da campanha de publicidade, disse que os anúncios pareciam estar fora de sintonia com muitos consumidores chineses que não conhecem os duelos do Velho Oeste, nem o boxe profissional ou o característico mau cheiro das axilas. Os anúncios “apostavam num senso de humor ocidental”, disse. “Poucos chineses entendem esse tipo de coisa”.
Fonte: NYTimes.com