Fundador da Niely investe em outra marca
Quase cinco anos após vender sua fabricante de produtos para cabelos Niely para a francesa L’Oréal, por mais de R$ 1 bilhão, o empresário Daniel Fonseca de Jesus, de 60 anos, vai retornar ao mercado que fez dele um dos empreendedores mais conhecidos do país, o de cosméticos.
Os investimentos envolvem desde a montagem de equipe até o marketing do novo negócio, como publicidade e campanhas em pontos de venda. Uma atriz global a ser anunciada será a cara – e os cabelos – da nova marca. Cerca de 300 expositoras serão contratadas para apresentar os produtos às clientes em lojas pelo país.
“Estou de volta ao mercado. E queremos ser uma grande empresa de cosméticos”, diz Daniel de Jesus, em entrevista ao Valor, na sede de sua holding Milano, na Barra da Tijuca. “Queremos 10% do mercado de coloração e tratamento em cinco anos. Serão cinco anos de trabalho duro de marketing, distribuição, vendas. Trabalho formiguinha, de segunda a segunda”.
O empresário prefere manter, por enquanto, o nome da nova marca sob sigilo – faltam detalhes para anunciá-la, como concluir uma negociação sobre o domínio de internet, já que a endereço está registrado por um pequeno empresário. Quando fundou a Niely, o nome foi uma homenagem à filha Danielle.
Como considera o mercado de cosméticos maduro, com baixo crescimento ano a ano, a participação almejada viria das fatia de concorrentes, como a Koleston (Wella) e da própria Niely, a empresa que fundou em 1986 e que chegou a faturar R$ 540 milhões em 2014, quando foi vendida.
O carro-chefe de Daniel de Jesus deverá ser novamente o produto de tintura cor creme, segmento que fez da Niely uma campeã de vendas por meio da marca Cor&Ton. Segundo ele, o produto da agora concorrente ainda venderia cerca de 5 milhões de unidades mensais no país.
“Sempre tivemos a formulação da coloração creme. O que precisamos foi atualizar a fórmula”, diz o empresário, que contratou assessorias do país e do exterior para desenvolvimentos dos produtos. “Para frente, podemos avaliar linhas de produtos de maquiagem e tratamento de pele.”
O retorno ao mercado de cosméticos foi possível com o término do período de “quarentena” (cláusula de não competição) do empresário na L’Oréal, no fim do ano passado. Desde que vendeu a empresa em 2014, ele vinha ocupando o cargo de vice-presidente do comitê estratégico da L’Oréal.
“Eu fui comunicar pessoalmente para a L’Oréal a decisão de entrar novamente no mercado de cosméticos. Cumpri nossos acordos e ser decente é a melhor coisa que existe”, diz o empresário, acrescentando que sua relação com a gigante francesa sempre foi positiva. “Eles disseram que não queriam ter a gente como concorrente”.
O empresário costuma dizer que a motivação da venda da Niely não foi dinheiro, mas o reconhecimento de que sua empresa tinha produtos de qualidade a ponto de interessar à maior do setor no mundo. Toda essa capitalização, porém, será evidentemente um diferencial em seu retorno ao setor, além da experiência acumulada ao longo de 30 anos nesse mercado.
“Quando fundei a Niely eu não tinha dinheiro e nem experiência, mas o mercado não estava maduro. Agora somos capitalizados e temos experiência, mas o mercado está maduro. São desafios opostos”, diz o empresário. “Nosso diferencial seguirá o mesmo de 20 anos atrás, que é distribuição e qualidade.”
A história de Daniel de Jesus é um roteiro de filme. Nascido de família simples no Rio, aos 12 anos vendia picolé no trem para ajudar nas contas de casa. Foi office-boy em uma imobiliária até fundar em 1981 uma empresa de limpeza em Nova Iguaçu (RJ). Com sensibilidade para captar os desejos de consumidoras, decidiu mudar para o ramo de beleza em 1986.
O primeiro saldo da Niely foi com a venda de produtos para cabelos crespos (xampus, condicionadores e alisantes) em 1995. Em 2000, estendeu a estratégia para tinturas para cabelos. Quatro anos depois, lançou a marca Niely Gold, que foi acompanhada de forte investimento em marketing de TV. O foco sempre foi consumidores das classes C, D e E.
“Vou novamente focar nas classes C, D e E. Prefiro vender cem pedidos de R$ 2 mil do que um pedido de R$ 100 mil. No primeiro caso, se dez pedidos pararem, ainda tenho noventa. No segundo caso, se um pedido faltar, eu fecho a fábrica”, acrescenta o empresário, que desta vez vai terceirizar a produção. Ele espera definir um sócio dentro de 60 a 90 dias.
Em paralelo, Daniel de Jesus está investindo R$ 10 milhões na construção de uma sede para a nova empresa e sua holding. A empresa será presidida por ele e terá na vice-presidência geral sua filha mais velha, Danielle, que passou uma temporada na L’Oréal em Nova York após a venda da empresa.
A volta ao setor de cosméticos não significa, contudo, uma saída da aposentadoria. Daniel de Jesus, na verdade, nunca se aposentou. Além do cargo que ocupou na L’Oréal, sua holding Milano tem participação no Taco Bells, na Eleva, na Cultura Inglesa e em um empreendimento de 1,2 mil imóveis em Nova Iguaçu (RJ), entre outras.
O empresário diz que, após a venda da Niely, entrou em “quase depressão” – não em termos clínicos, mas no aspecto de uma rotina ociosa. Residente em Angra dos Reis (RJ), ele afirma que “passa mal” se ficar mais do que quatro dias longe do trabalho. “Mas já conversei com Deus. Eu pedi a Ele essa chance de fazer de novo uma grande empresa do setor”, conclui.
Fonte: Valor 13.06.2019