Beleza limpa: entenda o conceito e saiba a diferença entre cosméticos naturais, orgânicos e veganos
Mesmo sem uma regulamentação oficial para os produtos, empresas investem cada vez mais em tecnologias para entregar performance
Do sabonete artesanal à base de plantas ao sérum desenvolvido a partir de alta tecnologia, as linhas de cosméticos naturais vêm abrindo cada vez mais o leque para quem prefere ler os rótulos antes das compras. Consolidado (e popularizado) na pandemia, o fenômeno clean beauty (em inglês, beleza limpa) lança luz a marcas voltadas à inovação e às demandas de um público exigente em relação aos impactos do uso dos produtos à saúde e ao meio ambiente.
A ideia é exercer a consciência sobre o consumo, e isso significa que todos os aspectos fazem diferença na hora da escolha — especialmente, os princípios ativos e matérias-primas. Segundo a especialista em estética e cosmetologia avançada Daniela López, para que seja considerado natural, o item precisa ter mais de 90% de teor biológico em sua composição, sem químicos nem sintéticos, e sua embalagem deve ser feita com material reciclável.
A profissional explica que há diferenças entre este tipo de produtos e outros de pegada sustentável, como os orgânicos, por exemplo. Como não existe uma lei que regule especificamente os cosméticos não tradicionais, a alternativa para entender quais atendem às suas expectativas é prestar atenção às informações no rótulo. Daniela lembra que alguns órgãos reconhecem as formulações e práticas limpas por meio de selos.
Uma das principais certificadoras é a IBD, que estabelece regras para produtos e ingredientes. Entre as normas gerais estão a proibição de testes em animais — tanto para os insumos quanto para os produtos acabados — e da aplicação de organismos geneticamente modificados.
Conforme a cartilha, a classificação dos naturais exige que, pelo menos, 95% das matérias-primas sejam naturais — sem modificações. A IBD determina, ainda, que sejam excluídos corantes, fragrâncias, conservantes e silicones sintéticos, entre outras substâncias. Para os orgânicos, pelo menos 95% das matérias-primas devem ser orgânicas (ou 70% de orgânicas para os rotulados como Feito com Ingredientes Orgânicos).
— É uma linha tênue que os separa. Para identificar, é necessário confiar na leitura do rótulo — destaca Daniela López.
Há ainda a família dos veganos, cuja característica fundamental é que sejam livres de origem animal em todos os elementos da cadeia (incluindo os materiais de seus fornecedores). Estes produtos contam com selos da Associação Brasileira de Veganismo, da Organização Veganismo Brasil e da Sociedade Vegetariana Brasileira.
No consultório
Para quem está de olho na beleza em harmonia com a saúde, mas ainda tem dúvidas sobre o melhor caminho a seguir, a dermatologista Mariele Bevilaqua, que atende em Porto Alegre, aconselha buscar orientação médica.
— O uso dos cosméticos naturais é indicado quando o paciente deseja produtos sem compostos químicos e conservantes da indústria e também para quem tem alergia a determinados componentes. Mas tudo depende dos ativos, porque ser natural não significa que seja isento de riscos — explica.
Via de regra, para pessoas que não têm histórico de alergia aos elementos presentes na fórmula, não há contraindicações, afirma a dermatologista. Ela salienta que vale a pena prestar atenção às sutilezas.
— Alguns detergentes, como os sulfatos, costumam ser bem irritativos à pele. O cosmético natural pode não conter este elemento, mas algum derivado que também seja irritante. Além disso, conservantes usados para evitar contaminações microbiológicas (por fungos e bactérias) são necessários nas formulações. O que se deve atentar, por exemplo, é para que os mais alergênicos, como as isotiazolinonas, não estejam presentes, assim como os parabenos. Então, tem que cuidar, porque alguns podem dizer que não têm, mas têm. Isso acontece porque não há regulamentação pela Anvisa sobre o que é natural ou não no Brasil — alerta.
Uma dica é levar o rótulo do produto à consulta médica, para que o profissional possa ajudar na leitura dos componentes. Há ainda formulações com itens veganos, por exemplo, que podem ser manipuladas sob prescrição do próprio dermatologista.
Inovação
É nítida a evolução do skincare natural ao longo da última década. Além da responsabilidade ambiental, a eficiência na pele já está entre os aspectos mais valorizados neste nicho. A mistura de sucesso inclui ainda avanços tecnológicos, além de um trabalho estratégico de posicionamento de marca.
Não por acaso, histórias pessoais se sobressaem na trajetória de muitas destas empresas. A farmacêutica Luciane Rosa Feksa, de Porto Alegre, por exemplo, conta que, por muito tempo, viveu a frustração de não encontrar no mercado opções que atendessem às particularidades das peles escuras. Motivada pela dificuldade, que era comum a seus clientes na área da estética, resolveu usar seus conhecimentos para oferecer soluções voltadas a esse público.
Assim nasceu, em 2019, a Dandara Black, que a empresária afirma ser a primeira marca gaúcha de dermocosméticos naturais e veganos específicos para peles negras. PhD em Bioquímica e especialista em Cosmetologia, Luciane investiu na nanotecnologia para desenvolver formulações de alto desempenho, mergulhando em águas ainda pouco exploradas por aqui.
— O mercado não oferece dermocosméticos com ativos de alta qualidade e performance para o tratamento de peles com fototipos altos. Com base em inovação, conseguimos elaborar e selecionar os melhores ativos no tratamento da oleosidade, auxiliando no combate à acne, comedões e manchas — relata, enfatizando que, já nos primeiros testes com homens e mulheres, os resultados foram positivos — Todos aprovaram a mesma formulação e perceberam que havia um controle da oleosidade em torno de oito horas, sentindo a pele macia e hidratada. Assim, surgiu o hidratante facial queridinho deles — comemora.
A linha, batizada de Skin Savers, cresceu e inclui itens como sabonete facial fitoterápico com extratos vegetais, bruma biohidratante com 100% água termal e sérum concentrado de vitamina C — este último com o diferencial de não oxidação em contato com o ar, em função da proteção por lipossomas ou na forma de nanovitamina, o que potencializa a ação do produto.
— Não utilizamos petrolatos e parabenos, nossas embalagens são recicláveis e não realizamos testes em animais — reforça ela.
Beautytech
Outra marca que investe alto em sua (imensa) comunidade é a Simple Organic. Com sede em Florianópolis, Santa Catarina, a beautytech foi lançada em 2017, se apresentando como marca de produtos naturais, orgânicos, veganos, cruelty-free e sem gênero.
— Temos o olhar voltado para a sustentabilidade e o propósito de ser uma marca de impacto positivo. Temos produtos de alta performance, com teste clínico nos melhores laboratórios do Brasil, mostrando o melhor resultado. E entregamos algo que o consumidor constrói junto e se orgulha — defende a fundadora e CEO da Simple, Patricia Lima.
Com a experiência bem-sucedida no skincare, a marca ampliou seu portfólio para o sexualcare, saúde bucal e, em mais um lançamento disruptivo, anuncia a entrada de combos faciais em suas lojas físicas.
— Teremos protocolos 100% com matéria-prima orgânica e tratamentos faciais de alta performance. É a primeira marca de clean beauty a fazer isso e trazer essa inovação para o Brasil — comemora.
Procedência
A preocupação com a saúde foi uma das motivações das empresárias Luciana Navarro e Patrícia Camargo para a criação da Care Natural Beauty, de São Paulo, em 2018. A ideia é disponibilizar linhas de tratamento e maquiagem que não agridam o organismo nem o meio ambiente. Segundo as empreendedoras, os produtos são naturais, orgânicos e livres de toxinas.
— Temos essa missão informativa muito forte para que as consumidoras saibam que tudo que a gente passa na pele é absorvido e tem um impacto a médio e longo prazo na saúde e no planeta. Nossa cadeia produtiva é rastreada e trabalhamos apenas com ativos certificados pelo Cosmos Ecocert, livres de toxinas, químicos e metais pesados. Também contamos com o selo Eu Reciclo, CO2 Neutro, PETA Vegan & Cruelty-free e ainda promovemos o uso de refis em embalagem de alumínio — descreve Luciana.
De acordo com a sócia-fundadora da marca, mesmo os itens de make-up trazem ativos de skincare.
— Nossa prioridade também sempre foi ter uma cadeia produtiva responsável e entregar um produto final de extrema qualidade e performance, para desmistificar a ideia de que o natural e o orgânico não têm tecnologia embarcada — conclui.
No salão também
Ser adepto a cosméticos naturais não se restringe ao autocuidado no banheiro de casa. Hoje, são diversas as opções de estéticas e salões especializados na aplicação destas linhas, com as mais variadas filosofias.
À frente do Ateliê Vegano de Beleza, em Porto Alegre, a cabeleireira natural e terapeuta floral da Amazônia Catiana Lopes, de 39 anos, afirma que um corte ou tintura de cabelos representam muito mais do que aparência.
— Sempre que precisamos mudar algo interno ou queremos fazer um movimento na vida, a primeira coisa que pensamos é em mudar o cabelo, não é mesmo? É um processo terapêutico. Também vejo a importância de quem toca o seu cabelo, a sua cabeça, pois ela é o ponto mais alto do ser humano, é onde recebemos nossa inspiração. Encaro meu trabalho como uma missão mesmo — diz a profissional.
Desde 2015, ela trabalha exclusivamente com produtos naturais, orgânicos e veganos. E afirma que sua proposta é incentivar o consumo consciente, considerando suas possíveis consequências.
— Idealizei o Ateliê pensando que cada ação minha terá um reflexo no futuro, pois tudo o que eu dispensar terá um impacto na natureza. Assim, cuido da minha saúde e de cada cliente que chega — comenta.
Já Fernanda Griebler, de 32 anos, embelezadora de cabelos do Crua Natural Beauty, também na Capital, passou a investir em cosméticos naturais para os tratamentos de suas clientes como uma extensão do que já aplicava para si. Adepta do conceito de “beleza real”, ela acredita que abrir mão dos itens convencionais é fundamental para preservar a saúde e a estética dos cabelos, “cuidando também da mente e do espírito”.
— Começou a partir do meu autocuidado. Já não como carne há mais de 12 anos e sempre me preocupei com essa questão ecológica, o impacto que isso traz. Hoje, utilizamos somente os naturais, que não contenham nada de origem animal, e a maior parte deles, biodegradável. Produtos que não agridam a saúde humana e nem o meio ambiente — conta ela.
Fonte: gauchazh 29.06.2022