Marketing multinível se renova após pirâmides
A venda direta é um canal que atrai o interesse de diversos empresários e empreendedores. A categoria é uma das mais promissoras para se destacar em 2015, uma vez que a crise faz com que as pessoas busquem uma nova fonte de renda. O nicho de multinível, no entanto, ainda atua com cautela após ter sua imagem arranhada pelos esquemas de pirâmides, ocorridos em 2013, quando operações da Receita Federal, do Ministério Público Federal e da Polícia Federal combateram a prática. O caso mais emblemático foi o da estrangeira Telex Free, que deixou de operar no país e no exterior após as denúncias. Ao ver a estratégia ser confundida com fraudes, o setor elaborou saídas para se renovar e estar cada vez mais próximo dos clientes.
A união entre as marcas e a Associação Brasileira de Empresas de Venda Direta fez com que as questões que arranhavam a idoneidade dos negócios fossem trabalhadas. A nova postura adotada foi fundamental para que o faturamento não caísse nem perdessem parte da fatia que o Brasil vem abocanhando no mundo – em 2013, foram movimentados US$ 178,52 bilhões, montante 8,1% maior do que o faturamento registrado em 2012, deixando o país em quinta posição no ranking global.
A comunicação clara com a rede e os consumidores foi o primeiro passo a ser tomado, para que não houvesse uma evasão. “As pirâmides eram negócios sem produtos. A pessoa pagava um alto valor e não tinha retorno, porque eles não lucravam com nenhuma transação e, sim, com a entrada de pessoas. Era um alimentador para quem estava no topo. No multinível, há a questão de comissionamento para a rede, mas em cima do que foi vendido. A comunicação interna e o endomarketing foram fundamentais nessa hora”, conta Rui Adriano Rosas, Sócio e Diretor de Projetos da DirectBiz Consultants, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Mudanças fundamentais
Enquanto as empresas fraudulentas fazem grandes promessas de retorno rápido e fácil, as relacionadas à venda direta seguem o caminho oposto, porque sabem que o lucro de cada vendedor depende apenas do trabalho dele. Os treinamentos, que já existiam, passaram a ser constantes a fim de reeducar as equipes, motivá-las e melhorar as abordagens quanto aos artigos oferecidos. O objetivo é mudar uma cultura que foi amplamente difundida ao longo dos anos, de focar apenas nos possíveis lucros e não no havia em estoque.
Para se desvincular das pirâmides as estratégias precisaram ser revistas. “As empresas estão com planos agressivos, porém lícitos. O foco é se aproximar do consumidor com o que ele quer. Para isso, foi implantado um sistema do líder que também passa a ser distribuidor, a fim de manter agilidade e melhorar a logística. O comissionado deixou de ter a posição cômoda de outros tempos. Os encontros com os liderados têm como premissa a passagem de conteúdo, o relacionamento e a explicação sobre cada item, porque quanto mais são treinados, melhor irão vender”, afirma Rosas.
Algumas empresas pegas no esquema se justificaram como sendo multinível, o que exigiu um reposicionamento das companhias do setor, até mesmo na forma com que bonificam as equipes. “As marcas repensaram essas remunerações e limparam qualquer coisa que tivesse significado piramidal. A questão financeira era o que mais as aproximava e foi justamente nisso que elas se empenharam em mudar. Foi necessário olhar para todas as formas de bônus e retirar o que poderia ser entendido como errado. Agora elas estão vivendo uma fase de bonança”, conta Rosas.
Formatos de negócios
Uma das empresas que fizeram revisões de modelo foi a Hinode, que aproveitou para levar o Marketing multinível a um novo patamar, transformando os distribuidores em franqueados. A padronização ocorreu em todo o Brasil, incluindo o cadastro por CNPJ dessas pessoas. Desta forma, a empresa de vendas de artigos de beleza e bem-estar buscou mostrar um maior compromisso tanto com quem trabalha quanto com quem compra. As condições de suporte passam a gerar segurança, uma vez que o consultor possui estoque com fácil acesso e o ciclo de pedido torna-se reduzido.
A preocupação em entregar o produto de outras maneiras iniciou um novo processo dentro da marca e para o próprio setor. “Reinventar-se faz parte da sobrevivência de cada companhia. No nosso caso não sentimos muito impacto em relação às fraudes, porque sempre baseamos a estratégia em comunicação e foco no portfólio. Deixamos de ser mononível justamente quando as notícias colocavam o setor no centro do problema. Por causa do forte trabalho que fizemos, isso em nenhum momento nos afetou”, conta Eduardo Frayha, Vice-Presidente de Vendas e Marketing da Hinode, em entrevista ao Mundo do Marketing.
O modelo de negócio foi pensado para atender o que as pessoas querem enquanto empreendedoras, já que os profissionais deste nicho têm exigências que os demais não possuem. “Eles não visam apenas ao lucro, existe um propósito por trás. Eles querem conteúdo, informação e estar próximos às lideranças para aprender. São pessoas que entendem que tudo isso gera independência financeira. É importante filtrar o que o líder diz e buscar capacitação e reconhecimento. É um meio extremamente complexo, em que o Brasil está aprendendo a atuar e que em outros países já há uma consolidação, a exemplo da Amway”, conta Frayha.
Segurança para o futuro
Apesar da estruturação desse mercado acontecer após um momento de crise na categoria, a resposta mostrou-se madura e deixa os empresários mais tranquilos e prontos caso haja uma nova tentativa de formação de pirâmides no país. As marcas que são mais agressivas nas vendas ainda tendem a ser confundidas com as ilícitas pelo nível de cobrança, mas é a dedicação em torno do que oferecem é que vai indicar naturalmente se o investimento é válido ou não.
Com a remodelação e os atuais mecanismos de comunicação, os empresários se sentem mais seguros em relação ao futuro. “As marcas que estão me procurando estão focadas em produtividade. Elas já entenderam que venda direta precisa oferecer algo em troca para quem trabalha. Ainda mais em ano de crise, as pessoas querem ver resultado. Quem entra nesse ramo já entendeu que, se não há vantagem, existe algo errado e saem”, conta Sergio Buaiz, Especialista e Consultor em Modelos Comerciais, Fidelização e Equipes de Vendas.
A adoção de multicanais também foi uma saída encontrada para quem atua em multinível. Quanto mais frentes, mais real e viva se torna a marca para os clientes. “A internet vem sendo uma aliada, porque conseguimos difundir nosso modelo, atrair novos interessados, além de ser um ponto de contato para vendas. Venda direta, loja física e quiosques também possuem sua importância e mostram o quão amadurecido está o setor”, conta o especialista.
Há quem veja um lado positivo nessa polêmica. “Quem já atuava na área ganhou mais visibilidade e pôde apresentar cases de sucesso, atraindo mais interessados no negócio. Não existe crescimento sem desafio. O que vivemos em 2013 foi necessário para que o setor avançasse. Não foi um problema exclusivo do Brasil, mas o país soube lidar e contornar a questão com mudanças fundamentais que precisavam ser feitas para equiparar com o mercado internacional”, afirma Sergio Buaiz.
Fonte: Mundo do Marketing